quarta-feira, 13 de novembro de 2019

Pequenos pormenores para o estudo do mistério "Argonauta nº 130-A"

- O volume duplo comemorativo (Vampiro nº200) foi editado em 1964.

- Num catálogo da Livros do Brasil dessa altura (outubro ou novembro de 64) o Estação de Trânsito vem pré-anunciado como 80-A.

- No fim do 130-A a sinopse do nº seguinte é a do nº 81 (O Signo do Cão, editado em 64).

- Quem fez o 130-A não foram Eurico da Fonseca (tradução) e Lima de Freitas (capa), e sim Gilberto de Almeida (tradução) e Infante do Carmo (capa), os quais já tinham igualmente feito o duplo da Vampiro. Os primeiros retomam os serviços normais a partir do 131.

- A pré-publicação do 130-A não foi anunciada, como era uso na época.

Tudo isto indicia que o Estação de Trânsito foi pensado para sair em 1964 como 80-A (?). Por qualquer motivo, preferiram editá-lo no volume duplo da Vampiro; mas devem ter sobrado cadernos dessa publicação, pelo que foi decidido em 1968 fazer a famigerada publicação "a solo". E, talvez imaginando que os leitores não se interessariam muito (já teriam lido a obra 4 anos antes no duplo da Vampiro), a edição completa foi enviada para o Brasil, onde ainda é possível encontrá-la.

quinta-feira, 16 de junho de 2016

O Livro Fantasma - 3ª parte


Receita para fazer um 130-A você mesmo!

Ao saber que havia contrafações do 130 – A pensei: “Porque não fazer uma eu próprio?!” Não, não me interpretem mal! Não concordo de modo algum com a fraude. Todavia, uma vez que temos ao nosso dispor meios gráficos e eletrónicos muito avançados, porque não encarar este projeto como um desafio e fazermos nós mesmos um 130-A?! No fim de contas, uma fraude só é fraude se quisermos enganar alguém. Ao fazer isto, o meu objetivo é ultrapassar as dificuldades que se apresentam à concretização desta ideia. Perguntar-me-ão: “ - E o que faz depois aos livros contrafeitos?” Muito fácil: dá-los-ei aos amigos ou, quando muito, vende-los-ei por 10 euros (para custear as despesas inerentes ao projeto), não como originais, mas como curiosidades para quem quiser valorizar a sua coleção. Costuma-se dizer, “quem não tem cão, caça com gato”. Eu digo: “Quem não conseguir arranjar um original, ponha uma imitação na estante”. Pelo menos, provisoriamente... Melhor do que ter um hiato no sítio, mas isto é o que eu acho, claro.

Então: as capa, contracapa e lombada, com algum trabalho de fotografia, digitalização e photoshop (ou programas equivalentes) arranjam-se facilmente. Idem em relação às 4 primeiras páginas e à página final que, sendo todas a preto e branco, ainda oferecem menos dificuldades.

O problema começa a surgir em relação ao livro propriamente dito, ao seu núcleo. Como o obter? Bem, pese a quem pesar, eu resolvi-o canibalizando alguns nºs 200 da Vampiro. É um livro que, sem ser fácil de arranjar, aparece com alguma frequência. É manter os olhos abertos no OLX, Coisas ou Custo Justo, ou peregrinar pelos alfarrabistas até conseguir. Em seguida, engula em seco, respire fundo e tire-lhe cirurgicamente a metade de que precisa!

O verdadeiro problema põe-se quanto à parte física das 4 primeiras páginas, bem como da última: apesar de serem fáceis de fotocopiar, o papel a usar não é nada fácil de obter! Trata-se de papel de 65-70 gr, ordinarote, poroso e velho de 50 anos! Isso confere-lhe um estado seco e amarelecido que não é fácil de imitar. Durante muito tempo debati-me com este problema. Podia-se, com o photoshop, colorir as folhas até obter o tom requerido, mas a textura? Até que o acaso (ou Mercúrio ou Loki, deuses das patifarias...) me forneceu a solução: na feira da Ladra arranjei duas sebentas em branco cujo papel era muito parecido! 
 



E pronto! Aqui fica exarado para que conste o modo de confecionar um 130-A que, sem prejudicar ninguém, valorizará, como curiosidade, as suas estantes enquanto não vier aquele dia em que, como eu, consiga obter um original. Muita sorte nesse sentido.

Fiquem bem e leiam FC!

Abraço,
José Paula Santos


NOTA DE REPÚDIO: Caros leitores, o autor não aconselha nem sugere a quem quer que seja iniciar uma florescente atividade contrafativa, sendo que tal infringe sem dúvida uma meia dúzia de leis e regulamentos, nem por qualquer meio se responsabiliza se alguém, contrariando frontalmente esta nota, o fizer. Se alguém se sentir tentado, sugere-se a consulta da asae ou da spa, que prontamente o elucidarão sobre o assunto, após o que sentirá dentro do peito a satisfação do dever cumprido! Este artigo pretende ter um papel meramente lúdico, assim a modos que um "suponhamose-o"... , que como todos sabem, constitui a base da verdadeira FC. Parafraseando o E.T. : "Beee Goood..."

quarta-feira, 15 de junho de 2016

O Livro Fantasma - 2ª parte


2ª PARTE

De qualquer modo, e por terem já aparecido contrafações do livro, escrevo este artigo para ajudar a reconhecer the real mc coy.

Nem sequer me vou referir aos problemas que envolvem a data de publicação deste volume, incerta e debatida ad nauseam em sites excelentes, como, por exemplo, o do João Vagos, trabalho exaustivo de pesquisa e imagemque reúne capas impecavelmente fotografadas de diversas coleções emblemáticas, ligadas à ficção cientifica:  http://coleccaoargonauta.blogspot.pt/ . O objetivo assumido deste artigo é o de estabelecer, duma vez por todas, referências que permitam a um potencial comprador distinguir o trigo do joio literário (que também o há...). 
 

Em princípio, o que aparece com alguma frequência é o volume duplo, comemorativo dos 200 números da Vampiro. Imitando a Ace Double, coleção americana que congregava dois livros no mesmo volume, lá aparece dum lado O Caso da Vela Torcida, de Erle Stanley Gardner, e do outro Estação de Trânsito, de Clifford D. Simak.

Devido à raridade da outra edição, é este quase o único meio que os leitores tem para apreciar esta obra (a não ser que a leiam no original inglês). Para mim, Simak tem outras bem melhores, mas os gostos são estritamente pessoais, e também não os discutirei aqui. Pelo que dizem, não se discutem (se bem que, às vezes, se tenham de aturar...).

Suponhamos que quero comprar um 130-A (e quem não quer?!). Aparece na net uma pessoa a vende-lo por um preço acessível. Ótimo, mas… já apareceram contrafacções do livro, produzidas através da manipulação do vampiro 200… então, como ver se o produto é fidedigno? 
 

A primeira referência para reconhecer a edição verdadeira é que ela é single, e não dupla. 
 

A capa: em geral, a capa da Vampiro tem cores menos saturadas, mais suaves do que a da Argonauta; esta última, para além da saturação cromática, apresenta os brancos com uma dominante amarelada intensa, talvez devida à passagem do tempo. 


Capas de Vampiro 200 e de Argonauta 130-A












Uma característica comum às duas capas é que, no extremo superior (em verde oliva, e contendo a menção “os grandes romances de ficção científica”), a última letra está semicortada, apresentando uma guilhotinação exagerada, o que faz com que apareça apenas a perna esquerda do A final. As capas das imitações tendem a apresentar o A completo.

A contracapa: A contracapa da Vampiro apresenta a capa do Caso da Vela Torcida, de pernas para o ar; a da Argonauta é como segue na foto.

Contracapas de Vampiro 200 e de Argonauta 130-A


A lombada: A da Vampiro tem cor azul forte, com os títulos em preto e os autores em branco, lado a lado; a da Argonauta tem cor dada por um filete fino, vermelho (que devido ao tempo se apresenta mais acastanhado), com as letras impressas a preto.

Lombadas de Vampiro 200 e de Argonauta 130-A












A primeira página: Enquanto na Vampiro o título aparece em tipo mais pequeno e chegado à direita, na Argonauta o tipo é maior e mais espaçado; em baixo aparece uma advertência ao leitor, que na Vampiro constitui uma mancha gráfica à esquerda, e na Argonauta, à direita 

.
1ª pág. Argonauta 130-A
1ª pág. Vampiro 200











 

A segunda página: A segunda página da Vampiro aparece nua, enquanto na Argonauta aparece a lista das obras anteriores e a publicar.



2ª pág. Vampiro 200


2ª pág. Argonauta 130-A















A terceira página: A da Vampiro refere-se ao facto de ser um número comemorativo, com o número, um volume duplo e o logotipo respetivo (o morcego de asas abertas); a da Argonauta mostra o número 130 – A, o logotipo LB dos Livros do Brasil e o da coleção Argonauta (o ícaro voando em direção a uma estrela). 


 
3ª pág. Vampiro 200
3ª pág. Argonauta 130-A

















A quarta página: A única diferença reside em que, na Vampiro menciona-se em rodapé que o livro foi feito nas oficinas gráficas de Livros do Brasil, Rua dos Caetanos, 22, Lisboa; na Argonauta aparece apenas – Oficinas Gráficas de Livros do Brasil, Limitada. 



4ª pág. Argonauta 130-A
4ª pág. Vampiro 200














O fim de qualquer dos livros apresenta o próximo volume da coleção Argonauta como sendo O Signo do Cão, de Jean Hougron, em forma de sinopse.

 
última pág. de qualquer dos livros mencionados

 Cadernos das duas edições: qualquer das duas edições é composta por cadernos de 16 folhas, que se reúnem para formar o corpus do livro; estes cadernos estão marcados na parte esquerda do rodapé em tipo miúdo com a menção: nº do caderno + V. 200; assim, nas primeiras 16 folhas temos o primeiro caderno (sem marca), na pág. 33 temos o segundo (2-V. 200), na pág. 65, o terceiro (3-V. 200), na pág. 97, o quarto (4-V. 200), na pág. 129, o quinto (5-V. 200), na pág. 161, o sexto (6-V. 200) e na pág. 193, o sétimo e último (7-V. 200). Lê-se portanto “caderno 7 da Vampiro 200”. 

caderno 2

caderno 5
 
E pronto, de posse destes elementos a todos será fácil abrir a pestana e evitar adquirir qualquer produto menos próprio. Até à próxima, fiquem bem e sobretudo leiam FC!


José Paula Santos

terça-feira, 14 de junho de 2016

O Livro Fantasma - 1ª parte

(atribulações de um colecionador português)

No princípio não era o Verbo...
Podem achar estranho este início, mas garanto-lhes que é absolutamente verídico: no principio eu não lia...pela excelente razão de que não sabia ler! Mas adiante, que esta verdade lapalissiana não deve interessar a ninguém, por demasiado óbvia.

Depois, quando me comecei a interessar pelas imagens dos livros da Majora e pelas revistas da Orbis (editora brasileira que, nos anos 50 (!!!) traduzia e dava à luz as revistas e personagens americanas), que me liam, foi a descoberta de um mundo fascinante!

Daí à aquisição da leitura foi um passo: aprendi a ler com 5 anos e, quando a minha mãe saía comigo e me perguntava se queria um bolo, um chupa-chupa ou um livro… bem, adivinhem a resposta!

Continuei a ler, desta vez os títulos juvenis, ao longo de toda a minha adolescência. Tive até a duvidosa “honra” de me ser vedado o acesso aos livros da saudosa coleção Argonauta: um explicador de matemática que eu tive, senhor de rara inteli-jumência, descobriu um certo dia que eu tinha “demasiada imaginação”; por isso, dirigiu-se à biblioteca municipal do meu bairro e pediu-lhes que não me emprestassem os ditos... Uma vez que, nessa altura, não havia as campanhas atuais que pretendem aumentar a imaginação e estimular a leitura entre os jovens, e sendo que os adultos tinham sempre razão, foi o que eles fizeram. É claro que arranjei logo um amigo que andava na mesma explicação, requisitava os livros e mos dava, devolvendo-os pelo mesmo método (paz à inteli-jumência do homem, que a inteligência propriamente dita já tinha morrido há muito!).

Tive depois que ultrapassar outro Cerbero, na forma da minha mãe! Para ela, existiam duas atividades juvenis: o trabalho, consubstanciado em estudar o dia todo; e o resto, que incluía brincar, sair e ler. Claro que, como o dia não dava para tudo e o estudo era para ela prioritário, as minhas leituras começaram a ficar para trás.

Fui então obrigado a introduzir em casa livros à socapa; mas ela começou a revistar-me a mala à entrada. Era então um duelo de vontades e de imaginações: eu a descobrir processos de meter os livros em casa (deixá-los no patamar da escada ou na caixa do correio quando entrava, e ir buscá-los na primeira oportunidade; metê-los na cintura, da parte de trás; atá-los às pernas e braços, sob as mangas e as pernas das calças; etc.), ela a investigar, qual miss Marple… desse por onde desse, eu arranjava sempre meio de os contrabandear para casa!

Restava o problema de ler. Como eu tinha aulas logo de manhã, ela queria que me deitasse cedo, cerca das 10 da noite. Eu deitava-me e, quando tudo sossegava, acendia a luz e lia finalmente até às tantas! Mas ela começou a aperceber-se do esquema e a fazer raids ocasionais para ver se eu dormia mesmo. Eu ouvia-a e apagava a luz, mas ela apalpava o quebra-luz do candeeiro… como este era de metal, eu era apanhado, o que me valia uns estalos na cara!

Para repor a verdade-verdadinha, claro que também lia enquanto devia estudar… havia uma estante na casa de jantar mesmo ao lado da minha mesa de estudo, situação que eu aproveitava para ir “consultando” alguns textos de aventuras naquelas longas tardes da década de 60. Posso dizer que fui um “leitor clandestino”, o que, à distancia de cinquenta e tal anos, só aumenta as saudades e valoriza para mim o ato de ler.

Eu lia quase tudo. Nessa altura, deixados para trás os juvenis do costume, como Verne, Salgari, Stevenson, Marryat, já tinha há muito descoberto as delícias de Hamilton, Heinlein, Bradbury, Sturgeon, Clarke, eu sei lá o que mais!

Descobri a coleção Argonauta ainda na década de 50, com 4 ou 5 anos; o primeiro livro de que recordo a capa é o Sentinelas do Universo (argonauta nº16, de Eric Frank Russell). Mas nessa altura eu apenas contemplava as magníficas capas com desenhos de Pires de Lima e Cândido Costa Pinto...

Não me lembro quando li Estação de Trânsito, mas foi no volume duplo comemorativo dos 200 números da coleção Vampiro. Achei-o interessante, mas nada de especial (essa é ainda a minha opinião, Simak tem obras muito melhores). Passei depois por uma fase de desinteresse pela FC (mea culpa, mea maxima culpa...), e só muuuuuuito mais tarde me voltei a interessar pela mesma (não pela coleção em si, mas apenas pelos livros que nela me agradavam mais).

Só recentemente (2013) me mordeu novamente o bicho do colecionismo literário de FC. Foi dum momento para o outro (tipo coup de foudre), e levou-me a tentar obter os livros que tinham marcado a minha infância e juventude. Várias coleções, vários livros soltos, horas sem fim pelos alfarrabistas, muito dinheiro gasto - nada lamento! Para mim os livros constituem catalisadores de memória, trazendo-me de novo algo do que já passou e do que vivi.

Só muito mais tarde soube que existia uma edição singular do lido Estação de Trânsito. Que era muito raro, muito difícil de obter, tão mítico que alguns duvidavam da sua existência (qual Yeti ou monstro do Loch Ness), rapidamente percebi.

Nessa altura comecei a busca. Primeiro nos alfarrabistas; a maior parte nunca tinha ouvido falar disso; alguns confirmaram-me que era um livro muito raro. mudei o meu campo de busca para a internet. No OLX encontrei alguns anúncios, infelizmente já fechados e datando de há anos. Mas também encontrei o site do meu atual amigo, João Vagos, ele também um ardente amante de FC e que disponibilizou o video que agora lhes indico: https://www.youtube.com/watch?time_continue=7&v=hOMRzNEP5wQ 

Foi ele quem me estimulou, indiretamente, a não desistir. Chegado a essa fase de apetência, nada me faria parar! Passei então a pesquisar o livro nos sites brasileiros. Encontrei algumas referências aqui e ali. Contactei então uma amiga brasileira, convenientemente livreira e prestável, a quem comuniquei a minha pretensão. Ficou com a referência, e eu com a promessa de me contactar se algo aparecesse.

E apareceu! Um belo dia, recebo um email a dizer que um cunhado dela, que tinha colecionado a Argonauta até ao número 300 e tal, queria vender os livros que possuía, entre os quais o 130 – A!

Confesso que duvidei. Estava habituado a vários falsos alarmes, e a tratar-se da edição dupla ou mesmo de mutilações da mesma (a metade FC, claro). Assim, pedi confirmação por fotografia. E lá me chegou ela, tratando-se de facto do mito em pessoa!

Dei imediatamente voz de prisão (perdão, de compra) ao livro, que me chegou cá por correio especial de corrida (uma pipa de massa!) e faz atualmente parte destacada da minha biblioteca (protegido por um envoltório plástico e acompanhado por uma pastilha de cânfora, para desencorajar o apetite dos peixinhos de prata!). E não contente com isso, a mesma amiga já me arranjou, por terras de Vera Cruz, outro exemplar para um amigo de cá! A respetiva foto pode ser vista no portal deste blog. Tchanan!

O facto de o livro aparecer maioritariamente no Brasil cada vez mais me convence de que se trata de uma edição feita com cadernos de sobras do Vampiro nº200 (como se atesta no rodapé dos próprios cadernos constitutivos), e destinada exclusivamente, por alguma circunstância editorial, à venda do lado de lá. Se foi assim ou não, ignoro. Procurei alguém que tivesse trabalhado na edição dos Livros do Brasil nessa época, mas não encontrei ninguém, toda a gente reformada ou falecida. Assim, se alguém souber dar mais alguma informação, chegue-se à frente e fale, ou cale-se para sempre!

(Continua)